Deixe entrar sem bater, meu caro amigo, os que morrem de frio, mais por falta de amor do que por falta de roupa.
Deixe entrar sem bater os que perderam o rumo nos trilhos complicados da existência; talvez achem no céu do seu abraço a estrela de Belém.
Deixe entrar sem bater os que têm fome, mais de carinho do que de pão, e reparta com eles a sua vida, que vale mais que seu dinheiro.
Deixe entrar sem bater os que chegam à pé, empoeirados e cansados porque a passagem do destino era cara demais e ninguém lhes pagou sequer um bilhete de terceira classe no trem da felicidade.
Deixe entrar sem bater os que nasceram a contra-gosto porque a pílula falhou... e só foram recebidos na existência porque não havia outro jeito...
Deixe entrar sem bater o enjeitados no princípio: os filhos do prazer criminoso e egoísta; deixe entrar sem bater os enjeitados no fim: os velhos e velhinhas, que deram tudo de si, que perderam as pétalas da vida em benefício dos outros, seus filhos, e agora são deixados para murchar nos fundos dos asilos...
Deixe entrar como se o lar fosse deles os que não tiveram tempo de ser criança porque a vida lhes pôs uma enxada nas mãos quando devia pôr nelas algum brinquedo, os que nunca tiveram sorrisos em seus lábios porque a lágrima chegava sempre primeiro...
Deixe entrar sem bater todos estes, sem temer que falte espaço, pois num coração cristão sempre cabe mais um e até mais mil...
E depois que tiver a sala do peito lotada de infelizes, aleijados e famintos, você vai ter, amigo, a maior das surpresas, ao ver que a face torturada de tantos se transforma de repente no rosto sorridente de Jesus, falando para você:
- Meu caro amigo, agora é a sua vez: entre você também! A casa é sua, o céu é todo seu!
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